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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Alcoolismo na adolescência é problema de saúde pública

O consumo de álcool entre adolescentes no Brasil vem crescendo. De acordo com a legislação, vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente, bebida alcoólica a menores de 18 anos é crime sob pena de detenção de 2 a 4 anos. No entanto, apesar disso o acesso ao álcool parece fácil e muitas vezes é negligenciado.De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE) 2015, divulgada na última sexta-feira (26) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 50,9% dos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental no Ceará já experimentaram bebidas alcoólicas.


O levantamento, com estudantes de escolas particulares e públicas, realizado em 2015, mostra ainda que 41,5% conseguiu a bebida em festas, 28,9% com amigos e 12% compraram em mercados, lojas, bares ou supermercados.
Esse cenário é reflexo de uma construção social longa que relaciona o álcool ao lazer, comemoração e festa. Assim, com o rótulo de catalizador de felicidade, o perigo que ele promove fica escondido. Para o adolescente, cuja vulnerabilidade se apresenta mais forte, os motivos para iniciar o consumo de álcool são inúmeros. E os riscos também.
"Eles vão experimentar o álcool pela curiosidade, exposição, para compensar as fragilidades das relações, pela desorganização familiar, pela influência com dos amigos. Além disso, o jovem não tem atitude e comportamento que levem em conta outros valores, como segurança, ética, ficando expostos a outros riscos", explica o psiquiatra e presidente executivo Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), Arthur Guerra de Andrade.
Por si só o consumo de álcool já seria um grave problema. Estudos mostram que indivíduos que começaram a beber antes dos 15 anos têm cinco vezes mais chance de desenvolver problemas relacionados ao uso de álcool do que aqueles que começam a beber após os 21 anos. O consumo excessivo, também chamado de alcoolismo, está entre esses problemas. No entanto, a bebida alcoólica é considerada uma porta de entrada para o uso de outras drogas.
Foi o que aconteceu com o empresário Guilherme Bezerra. Aos 12 anos, experimentou o álcool para se sentir incluido na roda de amigos da escola. "Eu estudava em uma escola de meninos ricos e me sentia diferente, não tão bom. Hoje eu sei que comecei a beber para tentar preencher esse vazio. Bebi para querer ser o corajoso. Depois veio a droga. Tudo o que fiz era para aparecer", relembra ele, que hoje, aos 29 anos, comemora 8 anos de sobriedade.
Aos 14 anos, veio a primeira internação- já com experiência de associação do álcool a outras drogas como a maconha. "Eu me tornei alcoolista tanto quanto dependente de outras drogas". Depois dessa, foram mais 14, em clínicas especializadas, comunidades terapêuticas e manicômios. "Passei talvez 1 anos e meio da minha vida preso em manicômio. Mas eu não me revolto com isso. Sei que as internações foram necessárias para me manter vivo", conta ele.
Sem ajuda
De fato, o caso de Guilherme é raro. Conforme explica a gerente de Célula de Atenção à Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza (SMS), Carolina Aires, os adolescentes não costumam buscar ajuda com o álcool aos Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPs AD). Eles geralmente só percebem o vício quando já entraram no consumo de outras substâncias. E com idade maior.
Realidade de Hanna Pereira, 25 anos. Vítima de exploração sexual, aos 13 anos, foi obrigada a usar cocaína. "Eles me obrigavam a usar porque pagava mais. Aí eu fui me viciando e, sempre que usava droga, eu também bebia muito. Quando vim pra Fortaleza, aos 19 anos, fui para o crack. Piorou tudo", relata ela que mora com o companheiro na Favela do Oitão Preto, no Centro.
O início do tratamento começou por aqui. Antes, nem sabia o que era um CAPs. Desde então, ela se internou algumas vezes para fazer a desintoxicação. As recaídas são muitas também. De volta ao Centro de Atendimento Psicossocial Álcool e Droga, na Barra do Ceará, ela contou que a última crise a deixou muito debilitada e assustada. "Vi bicho. Corria no meio da rua. Poderia ter morrido. Tenho medo de morrer, por isso eu queria sair dessa vida", relata.
O resultado do uso excessivo do álcool e droga para Hanna foi uma saúde debilitada. Já se internou com Tuberculose e Pneumonia. Morou na rua, assim como Guilherme. Ela se esforça para abandonar o comportamento, mas reconhece que as tentações são grandes. "O povo me dá droga, cachaça. Sou amiga dos traficantes, do povo da favela. Amiga, assim, né? Amigo das drogas é meio atravessado né? Já fiquei com fome e eles não me deram o que comer", conta ela que sonha em comprar uma casinha mais longe do acesso fácil à droga. "Só tenho medo de acabar minha casa com a droga. Por isso não tento agora".
Negligencia
Para Carolina Aires, da SMS, é importante ressaltar que o uso problemático do álcool está diretamente relacionado a um contexto social que torna o adolescente ainda mais fragilizado. Comum perceber que aqueles meninos que não tem acesso às políticas públicas sofre ainda mais. No entanto, todas as instituições- família, escola, sociedade e Estado- precisam estar atentos.
"Eu sinto muito que, durante todo o tempo em que estive na escola e fazia uso das drogas e álcool, nunca me chamaram para conversar com uma psicóloga. Era uma escola de ricos e eles fechavam os olhos", conta Guilherme que hoje desenvolve um projeto para levar alunos considerados "problema" para visitas à clinica de recuperação de drogas que hoje dirige. "Não dá pra não oferecer suporte. Eles precisam de todo esse cuidado, eles não tem maturidade para isso sozinhos", conta ele cheio de experiências de quem viveu tudo isso de um jeito bem seu.

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