Enquanto
a taxa de juros da economia estiver acima de 8,5%, nada muda, inclusive para
novas contas
Brasília. As regras de remuneração da caderneta de poupança, a
mais tradicional e popular aplicação financeira do país, mudam a partir de
hoje. O novo modelo vale apenas para novos depósitos e novas contas. As que já
existem até hoje seguem com o cálculo de seus rendimentos sem modificações.
A
nova regra terá um gatilho, a ser acionado sempre que a taxa básica de juros do
Banco Central, a Selic, for igual ou inferior a 8,5% ao ano - hoje ela está em
9%. Neste caso, as novas cadernetas de poupança e novos depósitos terão seus
rendimentos calculados com base em 70% da Selic, acrescidos da TR (Taxa
Referencial).
Enquanto a taxa do BC estiver acima de 8,5%, nada muda, inclusive
para as novas poupanças, que continuam a ter uma correção de 6,17% ao ano mais
TR como prevê o modelo atual. Ou seja, até 29 e 30 de maio, quando o Copom
(Comitê de Política Monetária do Banco Central) se reúne para decidir a nova
taxa de juros, todos os depósitos da poupança, velhos e novos, seguem a
correção atual.
Se
o BC reduzir os juros no final de maio para 8,5%, como é a expectativa do
Palácio do Planalto, os novos depósitos passam a seguir a nova sistemática.
Exemplo:
um poupador que tem, hoje, uma caderneta com saldo de R$ 50 mil não terá sua
remuneração alterada. Mas, se ele fizer um depósito de R$ 10 mil hoje, esse
dinheiro fica sujeito à nova regra. Será corrigido por 70% da Selic sempre que
o BC fixar os juros básicos num valor igual ou menor do que 8,5%. Pelos
cálculos da equipe econômica, com base nas novas regras, quando a Selic cair
para 8,5%, a nova poupança terá uma correção de 6,2% ao ano. Se cair para 8%, o
rendimento será de 5,6%. Se for reduzida para 6%, os novos depósitos ou contas
da poupança terão correção de 4,2%.
BC
liberado para reduzir
A
nova regra entra em vigor hoje por meio de medida provisória e foi uma decisão
da presidente Dilma Rousseff para liberar o Banco Central a seguir reduzindo a
taxa de juros básica -aquela que serve como referência para todo o mercado
financeiro.
Dilma
decidiu baixar a medida nesta semana, depois de uma reunião com o ministro
Guido Mantega (Fazenda) e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, há
duas semanas.
Seu
discurso de 1° de Maio, quando atacou duramente os juros elevados dos bancos
privados, fez parte da estratégia para preparar o terreno para mudar a poupança
com o menor desgaste político possível.
Com
o ataque, a presidente buscou evitar a mesma crítica sofrida pelo ex-presidente
Lula quando tentou adotar medida semelhante. Na época, ele foi acusado de
prejudicar os pequenos poupadores sem mexer com os banqueiros privados.
O
governo acredita que conseguirá convencer o Congresso e a população da
necessidade da medida sob o argumento de que, sem ela, os juros do BC não
poderiam ser mais reduzidos, ficando estacionados em 9% ao ano.
Nas
contas da equipe econômica, uma taxa de juros de 8,5% já começa a provocar fuga
de recursos de aplicações como fundos de investimentos para poupança, causando
desequilíbrios para o sistema financeiro e dificuldades para o Tesouro Nacional
refinanciar a dívida pública da União.
As
simulações feitas pela equipe econômica mostram, por exemplo, que com as regras
atuais, quando a taxa de juros do BC estiver em 8,5%, a poupança renderá 6,4%.
O rendimento é mais atrativo do que o de uma aplicação de renda fixa com taxa
de administração baixa (0,5%) e sujeita à cobrança do Imposto de Renda, que
pagaria cerca de 6%.
Além
disso, a presidente Dilma argumenta que nada muda para quem tem depósito na
poupança até ontem, não havendo perdas para esses poupadores nem quebra de
contratos. Ou seja, nas palavras de um técnico, o governo não vai
"garfar" dinheiro de quem tem conta até ontem.
Já
as novas contas e os novos depósitos deixarão de ter a garantia do rendimento
fixo de 6,17% ao ano e vão sofrer correções abaixo deste percentual sempre que
a Selic cair abaixo de 8% ao ano, de acordo com as contas de técnicos do
governo.
O
QUE ELES PENSAM
Modificações
elevam circulação do real
Mesmo
com a mudança, as condições continuam muito atraentes para a caderneta de
poupança. É uma medida excelente para os bancos e poupadores. Com uma inflação
menor, teremos maior liquidez e, assim, mais dinheiro circulando no mercado,
principalmente com a queda de juros. A economia brasileira vai se aquecer.
Lucio
Paiva
Diretor
e assessor jurídico da Abance
A
mudança na poupança representa mais uma medida corajosa da presidente Dilma,
pela redução dos juros e em favor da produção e do emprego. Preserva os
pequenos e médios poupadores, impede a migração de grandes investidores para a
poupança e retira dos bancos um possível argumento para manter elevadas taxas
de juros no Brasil.
Chico
Lopes
Deputado
federal
Regra
força fundos a reduzir taxa de administração
São
Paulo. Ao alterar a regra do rendimento da caderneta de poupança, além de
evitar uma migração indesejável dos aplicadores em fundos para a poupança no
caso de a Selic cair para o nível de 8,5% a 8%, o governo está forçando a
redução da taxa de administração dos fundos. A conclusão é do sócio-diretor da
Valorando Consultoria, Alexandre Póvoa. E a conta que baliza essa conclusão, de
acordo com ele, não é das mais difíceis.
Este
novo rendimento da poupança estaria praticamente empatado com a rentabilidade
média oferecida pelos fundos de investimento Isso porque da Selic de 8,5% ao
ano seria descontada uma taxa de administração de 1%, em média, mais algo em
torno de 1,5% decorrente da tributação pela taxa média de 17,5% do Imposto de
Renda, o que deixaria os fundos com um rendimento de algo próximo também a 6%
ao ano.
"Desta
forma, qualquer fundo que operar com uma taxa de administração superior a 1,5%
estará com problemas", diz Póvoa, para quem o governo está, com isso,
forçando os gestores de fundos a se tornar mais competitivos. Quanto à mudança
na regra da poupança, avalia o sócio da Valorando Consultoria, ela em si não
traz implícita nenhum compromisso de redução da taxa de juros. "Se todos
os problemas dos juros fossem a poupança, estaria muito bom", diz Póvoa.
Empecilho
removido
De
acordo com ele, ao alterar o rendimento da caderneta de poupança, o governo
removeu um empecilho, condição necessária, mas não suficiente, para baixar
juros. "Você baixa juros quando a economia está ruim. Até recentemente,
quando a economia estava aquecida, o governo poderia ter mexido na poupança e
mesmo assim a taxa de juros teria condições de ser reduzida", explica
Póvoa
O
economista-chefe de uma grande gestora de fundos e que pediu para não ser
identificado concorda com Póvoa. Segundo ele, com a Selic caindo para algo como
8% e 8,5% ao ano, se o governo não tivesse feito nada, certamente iria ocorrer
uma migração das aplicações dos fundos para a poupança, inundando o sistema
imobiliário com recursos além do necessário para financiar a moradia própria.
Isso porque, por lei, 65% do valor depositado na poupança deve ser direcionado
para as linhas de financiamento da casa própria. Mas como nada dos recursos da
poupança pode ser usado para a compra de títulos, o governo passaria a ter
dificuldades para financiar sua dívida.
OPINIÃO
DO ESPECIALISTA
Uma
nova realidade no Brasil
Delano
Macedo
Vice-presidente
do Ibef
O
rendimento da poupança como estava era entrave para a redução de juros. Esta
queda nas taxas é a bandeira da presidente Dilma. Se é uma meta e a poupança
ficasse como estava ia gerar um problema. Teria a diminuição de recursos
disponíveis na economia, problema para rolar a dívida pública, o mercado
imobiliário sofreria refluxo lá na frente. O fato é que se o Brasil tiver
condição de reduzir os juros sem gerar impacto na inflação e movimentar o
crédito e a economia, fazendo que o PIB do País cresça a 5%, é um excelente
cenário. Os benefícios são mais empregos, mobilidade social. Poupadores devem
se acostumar com rendimento menor. O Brasil não pode deixar de crescer porque
investidores vão ganhar menos. As pessoas vão ter ganhos produtivos e não
especulativos. É uma transição. A atratividade da poupança continua. O
rendimento menor fica compatível com outras aplicações, o que é adequado à nova
realidade.
´Mudança
é mínima´, afirma Mantega
Brasília.
O ministro Guido Mantega (Fazenda) afirmou que a mudança na remuneração da
poupança é "mínima". "A mudança é mínima, e não afeta os
interesses e benefícios dos correntistas da caderneta de poupança",
afirmou. "Para todos aquelas cadernetas com depósitos até o dia de hoje,
as regras ficam exatamente como estão, remuneração é a mesma de hoje e os
benefícios que poupança traz são exatamente os mesmos. Não haverá nenhum
prejuízo para os atuais detentores", disse.
O
saldo atual das 100 milhões de cadernetas de poupança ativas é de R$ 431
milhões, segundo o ministro. De acordo com ele, os 70% da Selic foram
estabelecidos pois essa foi a maior remuneração já paga pela poupança, em 2010,
segundo levantamento feito pelo governo. "Por isso usamos esse critério
para estabelecer a remuneração", declarou. Ele explicou que a medida foi
tomada para garantir o barateamento do crédito. "Teríamos uma invasão da
poupança por grandes investidores em títulos do Tesouro se a poupança se
tornasse mais atrativa que investimentos em títulos públicos, lastreados na
Selic. Seria uma pressão para que a Selic suba, e não desça", disse.
Mantega
afirmou que não acredita que a mudança na remuneração da caderneta de poupança
trará desgaste político ao governo. "Não é a política que nos pauta, mas
não acredito em desgaste político. Fizemos reunião com líderes da base aliada,
sindicalistas e empresários, e não houve nenhuma voz distante em relação a
isso, mesmo este sendo um ano eleitoral", disse.
Bancos
Mantega
disse ainda que a mudança fará com que os bancos reduzam suas taxas de
remuneração de fundos de investimentos. "Eles cobram taxas de 4%, 3%, 2%
ao ano, o que retira parte da rentabilidade dos fundos de investimento. Com
essa concorrência da poupança, as instituições financeiras serão levadas a
reduzirem suas taxas de administração", declarou.
´Adaptação
ao presente´, diz BCSão Paulo. O presidente do Banco Central (BC), Alexandre
Tombini, declarou ontem que as alterações na rentabilidade da caderneta de
poupança, anunciadas pelo governo, levam o Brasil a dar "um passo
fundamental na direção de remover resquícios herdados do período de inflação
alta"."Ao tempo em que preserva integralmente os depósitos já feitos,
a medida adapta a caderneta de poupança ao novo cenário brasileiro e com isso
consolida as bases para o crescimento econômico sustentável", afirmou, em
nota, Tombini.Popularidade continuaEle disse que a decisão de atrelar o
rendimento da poupança a 70% da taxa básica, mais a variação da TR, não afetará
a popularidade da aplicação. "A caderneta de poupança continuará sendo um
patrimônio da nossa sociedade, reconhecidamente um produto financeiro
tradicional, de fácil compreensão e amplamente utilizado pelos brasileiros"
Copilado
do Diário do Nordeste
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