Às vésperas de completar 30
anos da chegada da dengue no Ceará - o primeiro registro ocorreu em 1986 -, o
Estado enfrenta uma tríplice epidemia: de dengue, da febre chikungunya e do
vírus zika. O que essas três doenças têm em comum? O mosquito Aedes aegypti
como vetor. Ele representa ameaça também às gestantes, por causar, através do
zika, microcefalia em seus bebês, com possíveis lesões cerebrais que exigem
cuidados especiais.
Com alta capacidade de reprodução, o Aedes possui grande
potencial de multiplicação, sobretudo no ambiente urbano.
Existe
o receio ainda de que outro surto ocorra. O epidemiologista Manoel Dias da
Fonseca alerta que, teoricamente, o Aedes aegypti pode ser responsável pela
urbanização de outro vírus: o da febre amarela. Depois de 30 anos convivendo
com o Aedes, acrescenta que o governo e a sociedade civil precisam enfrentar,
com o mesmo espírito solidário e cooperativo, nova batalha contra o mosquito,
que se mostrou competente, resistente e capaz de se adaptar e sobreviver a
vários inseticidas já empregados pelo Ministério da Saúde.
Falhas
Embora
muitas vidas tenham sido poupadas ao longo desses anos em decorrência das ações
desenvolvidas pelo governo federal, em parceria com as secretarias de saúde
estaduais e municipais, o especialista comenta que é preciso reconhecer as
falhas no enfrentamento desta que considera grave ameaça. Os principais
desafios são: educação, comunicação, inovação tecnológica, saneamento básico e
a estratégia de investimentos.
Fonseca
observa que durante 15 anos, os investimentos foram concentrados em larvicidas,
inseticidas, máquinas e carros para borrifar inseticidas, embora também tenha
tido investimento na capacitação de profissionais para cuidar dos pacientes e
contratação de agentes de endemias. No entanto, só nos últimos 10, 15 anos
houve um investimento maior em inovação tecnológica: vacina e controle
biológico.
"Está
próximo de termos uma vacina razoavelmente eficaz contra os vírus da dengue e a
experiência de controle biológico com mosquitos transgênicos na Bahia precisa
ser corretamente avaliada, bem como outras pesquisas", avalia. Ele
questiona, porém, como superar o costume do brasileiro de "jogar lixo no
mato" e não separar e acondicioná-lo corretamente para reciclagem.
"Como fazer com que a população seja responsável por sua proteção e cuide
corretamente da sua casa? A estratégia dos agentes de endemias de fazer o que
cada um precisa fazer na sua casa, embora necessária por um tempo, reforça uma
certa passividade do cidadão", critica.
União
Fonseca
afirma que a escola exerce papel fundamental no sentido de orientar para a
importância de proteção ao meio ambiente doméstico e peridomiciliar. E nos
grandes aglomerados urbanos, diz que o saneamento básico, fornecimento de água
potável e de consumo precisam ser reavaliados e fortalecidos. "Talvez o
'odioso' (Aedes, em grego) do Egito, ao transmitir mais uma doença que afeta
bebês, o zika, nos leve a reforçar a união, a solidariedade e a criatividade
para, finalmente, vencê-lo", frisa.
Para
Anastácio Queiroz, infectologista e professor da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Ceará (UFC), preocupa a grande dificuldade de eliminar
o mosquito e, em especial, a incapacidade, até certo ponto, de reduzir a
morbidade causada pelas doenças por ele transmitidas: dengue, chikungunya e
zika, hoje endêmicas no Ceará.
Dentre
as patologias transmitidas pelo Aedes aegypti, o especialista afirma que a
dengue é a mais grave, porque tem capacidade de matar. Em 29 anos, foram mais
de 550 mil casos confirmados e 590 mortes no Ceará, conforme dados do Boletim
Epidemiológico da Dengue divulgado pela Secretaria da Saúde do Estado (Sesa).
Agora, o País está diante do vírus zika, que causa uma doença, em geral,
benigna, mas na mulher grávida tem capacidade de infectar o sistema nervoso do
feto, impedindo o desenvolvimento do cérebro, causando a microcefalia.
"É
preciso que todos tenhamos a clareza da gravidade do problema e o que, de
concreto, podemos e devemos fazer que é eliminar os criadouros do mosquito. Mas
é lamentável que as caixas d'água continuem sendo um dos principais focos,
quando sabemos que uma simples tela colocada corretamente pode eliminar este
tipo de criadouro de modo definitivo", critica.
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