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domingo, 24 de junho de 2012

Após 20 anos, ProCultura promete reciclar Lei Rouanet


Substitutivo deve promover mudanças significativas na mais importante lei de incentivo do País.

A lei completou 20 anos em dezembro do ano passado, mas nem todo artista ou grupo de artistas sabe, de fato, lidar com ela. Batizada com o nome do então secretário de Cultura, o filósofo Sérgio Paulo Rouanet, a lei 8.313 foi criada como forma de estimular o incentivo à cultura em diversos âmbitos, facilitando o financiamento de produtos culturais, inclusive via iniciativa privada. Em duas décadas, a Lei Rouanet já aprovou mais de 35 mil projetos, investindo cerca de R$ 12 bilhões.
Apenas no ano passado, mais de 8,5 mil projetos estava, em pauta no Ministério da Cultura e 12 mil, ainda em execução.
No entanto, em tantos anos, nem sempre o texto original foi representativo e conveniente ao processo de produção cultural, sofrendo várias modificações. A mais atual delas, sancionada em janeiro deste ano, reconhece a música gospel e os eventos a ela relacionados como manifestações culturais. Está, no entanto, em apreciação na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados um substitutivo para a Lei Rouanet, intitulado de ProCultura, concebido pelo deputado Pedro Eugênio (PT-PE) como forma de revisar os mecanismos de financiamento disponibilizados pelo texto atual. As mudanças propostas pelo ProCultura foram o mote da apresentação do secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura (Sefic/MinC), Henilton Menezes, durante sua passagem por Fortaleza, no último domingo, 17, no Zona Escola Roda de Conversa, integrante da programação do Zona de Transição (I Festival Internacional de Artes Cênicas do Ceará).

Diretrizes

A Rouanet permite que artistas ou grupos captem recursos para seus projetos através de três mecanismos distintos: a renúncia fiscal ou Mecenato, o Fundo Nacional de Cultura (FNC) ou ainda o Fundo de Investimento Cultural e Artístico (Ficart). O Mecenato acaba sendo o mais usual deles e nada mais é do que o apoio via patrocínio de empresas privadas, que recebem como contrapartida um desconto de até 4% no imposto de renda.

"Este incentivo foi desenhado para priorizar a sedução ao empresário, digamos assim. O MinC disponibiliza uma série de opções de projetos e o empresariado decide qual quer apoiar. Isso depende de muitos fatores, que partem de uma lógica própria do fazer empresarial. Aliás, muita gente vê a iniciativa privada como vilã, mas não é isso. É preciso entender também a intenção do empresário ao apoiar um evento", comenta Henilton.

Já através do FNC, recorre-se ao próprio governo como patrocinador. Este mecanismo é sugerido a projetos que talvez não possuam tantos atrativos à iniciativa privada, como, por exemplo, pesquisas e produções literárias com recortes muito específicos. Neste caso, o Fundo Nacional da Cultura financia até 80% do projeto, exigindo do proponente 20% de contrapartida.

"O FNC deveria chegar aonde o empresário não quer ir. A ideia era que o Ministério tivesse um mecanismo no qual não prevalecesse a sedução empresarial, mas a importância de preservação da cultura, independentemente do empresariado", explica o secretário.

Além desses, há ainda o Fundo de Investimento Cultural e Artístico (Ficart), que, na verdade, nunca saiu do papel, sobretudo porque representa alto risco financeiro ao empresariado. No Ficart, em vez de doação cria-se um fundo de investimento, que garante o reembolso das despesas dos apoiadores. "Este mecanismo é indicado a grandes produções artísticas, como shows de artistas, em que se visa lucro e se tem a certeza de excelente público", sugere Menezes.

Na prática, no entanto, além das particularidades de casa projeto, que tornam os usos da lei mais dinâmicos, nem sempre os mecanismos são escolhidos de forma ideal, provocando disparidade na divisão dos recursos, seja por região, seja por linguagem artística. Segundo os números apresentados por Henilton Menezes no Zona de Transição, 80% dos recursos captados no Brasil em 2011 se concentraram na região Sudeste, enquanto o nordeste ficou com pouco mais de 5%, uma consequência do interesse das empresas em divulgar suas marcas nos estados de maior visibilidade; na divisão por área cultural, Música (27%) e Artes Cênicas (24%) lideravam a quantidade de pautas encaminhadas a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), responsável pela análise de projetos, enquanto Artes Visuais (7%) ou Patrimônio Cultural (4%) se mantinham entre os últimos - também reflexo da lógica empresarial de maior visibilidade.

Segundo Menezes, o Ministério da Cultura atualmente apoia as mudanças propostas pelo Deputado Pedro Eugênio por entender que a sociedade brasileira tem demandado novos modos de se fazer cultura. "Se analisarmos o orçamento anual destinado à Cultura nos últimos anos, ele praticamente dobrou em um intervalo de cinco anos e isso, entre outros, porque desde a gestão do ex-ministro Gilberto Gil a Cultura passou a receber projetos de uma série de coisas que antes pareciam não se encaixar na pauta: cultura indígena, GLBT, afro descente... Houve uma ampliação do conceito de cultura e a lei de incentivo a esses projetos, de repente, parece não atender de forma conveniente a todos eles", defende Menezes.

A prova é que, em 2011 no Nordeste, dos mais de R$410 milhões aprovados para projetos, apenas R$67 milhões foram captados, ou seja, realmente foram executados. Uma porcentagem de apenas 16,44% de aproveitamento. "No MinC, se você comparar o valor do orçamento anual previsto e o valor investido vai ver que nosso aproveitamento foi quase total (96,7%), no entanto, ainda sim, muitos projetos ficam de fora. Isso é reflexo da grande quantidade de projetos enviados, mas principalmente da centralização dos recursos, que acontece, como eu disse, por causa da lógica empresarial de investimento e, por outro lado, do pouco potencial de investimento que alguns desses projetos oferecem", esclarece o secretário.

Mudanças

A proposta de Pedro Eugênio cria novos mecanismos que visam melhorar a distribuição dos recursos do FNC e do mecenato, bem como ampliar o montante nessas duas fontes de financiamento. Os valores do FNC poderão ser incrementados em até R$ 600 milhões, duas vezes o valor atual, que é de R$ 300 milhões.

A nova lei pretende, além de fortalecer o FNC para descentralizar os incentivos. A intenção é equilibrar o fomento proveniente do Estado e o do mecenato. "A ideia é, a partir do ProCultura, renúncia, que já funciona muito bem, e FNC sejam realinhados", assegura Menezes. Atualmente as empresas podem abater até 4% do imposto de renda. Com o ProCultura, ela poderá chegar a 6%. Deste valor, 1% será destinado ao FNC e o 1% final é dividido entre fundo e o projeto. Além disso, 5% da renda de loterias também será destinado ao fundo.

Segundo o relator do projeto, ainda que a proposta seja direcionar o fundo a localidades hoje pouco beneficiadas, o ProCultura não cria obstáculos para projetos cariocas e paulistas. O projeto só estabelece um piso para que parte do orçamento seja transferido a estados e municípios de outras regiões.

Outra novidade é a criação dos "territórios certificados", áreas definidas pelo Ministério da Cultura que receberão incentivos com prioridade. "Através do Conselho Nacional de Política Cultural vamos selecionar as áreas do país com menor volume de investimento e tentar compensar isso", acrescenta. Já quanto aos Ficart, a proposta é torná-los mais atrativos, garantindo pelo menos 50% de renúncia fiscal aos investidores.

Ceará

Entre os valores captados em 2011, a boa notícia é que o Ceará surge em posição regular. É o 10º estado brasileiro que mais executou projetos através da Lei Rouanet (cerca de R$ 15,9 milhões) e terceiro do Nordeste, perdendo apenas para Pernambuco (R$22,6) e Bahia (R$16,5). Segundo Henilton Menezes, é um montante razoável.

"Sempre acho que é possível aumentar, mas 15,9 milhões é uma boa performance, já que nos estados nordestinos que ocupam os dois primeiros lugares há empresas de maior porte. Para você ter uma comparação, estaremos lançando neste ano um edital específico para a região Amazônica, justamente porque a captação de lá é pífia. Rondônia, Acre, Tocantins, Amapá e Roraima são respectivamente os cinco últimos estados da lista. Este edital terá um volume de investimento de R$ 15 milhões", argumenta o secretário.

MAYARA DE ARAÚJO
REPÓRTER
Copilado do Diário do Nordeste

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