Agentes públicos de pelo menos
135 dos 184 municípios cearenses são investigados por possíveis práticas de
irregularidades no uso de recursos públicos nas prefeituras ou câmaras dos
vereadores. O levantamento é da Procuradoria de Justiça dos Crimes contra a
Administração Pública (Procap), do Ministério Público Estadual. Em 2015, o
órgão já deflagrou operações em Aquiraz, Fortaleza, Madalena, Juazeiro do Norte
e Itarema.
De 2012
a 2015,a Procap encaminhou ao Tribunal de Justiça do Estado 549 processos,
sendo 165 só neste ano. O órgão ajuizou 125 pedidos de autorização para
abertura de inquérito. Também foram instaurados 20 procedimentos
investigatórios criminais neste período.
Na
última quinta-feira, os integrantes da Procap, com suporte da Polícia Civil,
executaram operação na Câmara Municipal de Fortaleza que culminou em duas
prisões preventivas e busca e apreensão em seis endereços para apurar esquema
de desvio de Verba de Desempenho Parlamentar (VDP). Após operações anteriores
do Ministério Público, dois vereadores da Capital, Aonde É e Leonelzinho
Alencar, renunciaram ao mandato.
A
Procuradoria dos Crimes contra a Administração Pública investiga agentes
públicos municipais e estaduais com foro de prerrogativa por função, como
prefeitos e deputados. Promotores de Justiça do grupo relatam trabalhar em
parceria com outros órgãos fiscalizadores, como a Controladoria Geral da União
(CGU) e tribunais de contas, além das Polícia Civil e Federal.
Falsificação de documentos
Em maio
deste ano, integrantes do Ministério Público Estadual cumpriram mandados de
busca e apreensão na Prefeitura Municipal de Aquiraz para apurar supostos
crimes de peculato, corrupção, falsificação de documentos públicos, uso de
documento falso, dentre outros, atribuídos ao procurador geral do município,
David Sucupira Barreto, servidores municipais, advogados e empresários. A ação
teve reforço da Promotoria de Aquiraz, Procap e Grupo de Atuação Especial de
Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
A mesma
equipe atuou ainda em operação na Prefeitura Municipal de Madalena. As
denúncias, que culminaram no afastamento do prefeito Zarlul Kalil e de
secretários municipais, eram relativas a fraudes em licitações e desvios de
recursos.
O
prefeito Raimundo Macedo, de Juazeiro Norte, também chegou a ser afastado e
teve os bens bloqueados depois de operação da Procap e da Promotoria local para
apurar indícios de fraudes em procedimentos de desapropriação, permutas e
doações de imóveis em favorecimento da empresa AC Imóveis.
Em
agosto deste ano, o alvo da Procap foi a Prefeitura de Itarema. Sob acusações
de fraudes em licitações, falsificação de documentos públicos, uso de
documentos falsos e desvio de verbas públicas do transporte escolas, oito
pessoas foram presas na Operação Carroça.
Licitações
O
promotor de Justiça Luiz Alcântara, membro da Procap, aponta que são muitos os
caminhos para se desviar verbas públicas nos municípios: o trâmite inicia nas
licitações, perpassando aquisições de bens e serviços, execução de obras,
contratação de transporte e escolar e aquisição de merenda para as escolas.
Para acompanhar as contratações feitas nas prefeituras e câmaras municipais,
promotores de Justiça contam com suporte de relatórios enviados pelos tribunais
de contas, principalmente o dos Municípios (TCM).
No
entanto, a carência de profissionais no Ministério Público é unanimidade nas
reclamações dos promotores. "Ministério Público precisa se dar conta de
que não é possível mais se fazer combate à corrupção de forma amadora,
romântica", aponta o promotor Luiz Alcântara, da Procap, formada por um
procurador de Justiça e cinco promotores de Justiça. "Não temos a Lava
Jato aqui", completa Eloilson Landim, também da Procap, referindo- se à
operação que apura desvios de verba na Petrobras.
O
argumento (citado até por alguns integrantes de órgãos de controle) de que, em
muitas circunstâncias, os gestores municipais cometem crimes contra a
administração pública por falta de informações é rebatido pelos promotores de
Justiça, que chamam a justificativa de "falácia".
"Isso
é uma falácia, não existe. Os gestores pagam a preço de ouro assessoria da
melhor qualidade nos aspectos contábil, jurídico e relacionados aos meios de
comunicação no Interior", alega Luiz Alcântara. "Na verdade, é uma
falta de caráter, porque não é necessário ser formado, graduado ou doutor para
saber que é crime se apropriar de algo que não é dele", opina o promotor.
Outro
problema indicado pelos integrantes do Ministério Público é a demora na
tramitação dos processos, levando alguns à prescrição. O promotor de Justiça
Ricardo Rocha, que integra o Procap, defende que haja a criação de uma câmara
especial no Tribunal de Justiça para julgar crimes contra a administração
pública. Ele afirma que a iniciativa já foi implementada em outros estados do
País.
Impunidade
Para
Luiz Alcântara, a criação de uma vara especializada em crimes contra a
administração pública, lavagem de dinheiro e organização criminada no Tribunal
de Justiça iria acelerar julgamentos contra a corrupção e reduzir a impunidade.
"Apesar de tantas operações do Ministério Público, da Polícia Federal e de
outros órgãos, nós não vemos a concretização disso com pessoas condenadas,
presas e tendo que devolver recursos ao patrimônio Público", detalha.
"Os processos não chegam a um ponto final".
Eloilson
Landim reforça a necessidade de uma atuação especializada tanto no Ministério
Público como na Justiça, levando em conta as peculiaridades contábeis e
jurídicas dos atos referentes à gestão pública. "A especialização nas
matérias não pode ser ignorada. Não foi e não está sendo suficiente",
avalia.
Ricardo
Rocha salienta que o controle social é pouco atuante para barrar a malversação
de verbas públicas. Ele diz que o Ministério Público fez inúmeras recomendações
às prefeituras para que elas aprimorem seus portais da transparência, onde
constam os principais dados e balanços orçamentários da gestão.
Falta de estrutura
"Ministério
Público precisa se dar conta de que não é possível fazer combate à corrupção de
uma forma amadora, romântica"
Luiz Alcântara
Promotor de Justiça
Nenhum comentário:
Postar um comentário