Brasília. O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a
julgar, ontem, um recurso que poderá resultar na descriminalização das drogas
para consumo próprio. O tema tomou quase toda a pauta do plenário, mas os ministros
não começaram a votar.
A
sessão foi dedicada às sustentações orais das partes do caso e dos "amigos
da Corte", pessoas e instituições interessadas no tema. O adiamento se deu
devido à falta de tempo suficiente para que todas as partes se manifestassem e
para que os ministros proferissem seus votos.
Um dos
primeiros a falar foi o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que se
manifestou contrário à descriminaliza-ção das drogas para consumo próprio. Ele
apresentou a visão do Ministério Público, que recomenda ao Supremo a rejeição
de recurso sobre o tema.
O
procurador-geral argumentou que a descriminalização pode modificar a forma como
o tráfico é feito hoje. Ele considera que, se o porte de pequenas quantidades,
que seria classificado como para consumo próprio, for legalizado, os
traficantes passariam a transportar entorpecentes em pequenas quantias para se
adequar à nova lei.
"Vamos
lembrar que o mercado ilícito é algo que gira em torno de R$ 3,7 bilhões. Essas
pessoas mais organizadas certamente não terão muito trabalho para organizar o
exército das formigas", declarou.
Janot
enfatizou ainda que a discussão em curso é sobre o uso de drogas, e não sobre o
porte. Contudo, ele falou sobre o impacto do uso de entorpecentes na saúde
pública e argumentou que 90% das pessoas expostas ao uso de drogas se tornam viciadas.
"O argumento da maconha vem sempre como substrato, mas o que se está
falando daqui é de pequeno porte de droga. Vamos lembrar do crack",
comentou.
Sobre o
julgamento em curso, Janot disse que, se a Corte decidir pela
descriminalização, "estará interditando o legislativo de formular política
pública".
Além do
procurador-geral, o defensor público do Estado de São Paulo, que representa o
autor do recurso, Rafael Muneratti, se pronunciou sobre o tema. Durante a sua
fala, o defensor levou à tribuna números de outros países sobre drogas.
Ele
citou o exemplo da Argentina, dizendo que a descrimi- nalização das drogas no
país latino-americano reduziu a taxa de consumo de maconha de 9,7% em 2008 para
9,1% em 2010. "Assim como o consumo de cocaína, que reduziu 0,9% em 2010.
A busca de alternativas fora do sistema repressivo é uma tendência
mundial".
Já o
procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Marcio Elias Rosa, se
manifestou contra a descriminalização. Ele rejeitou que experiências
internacionais possam ser usadas para fundamentar a descriminalização no País.
"Espanha, Uruguai, Estados Unidos e países europeus podem ter adotado a
descrimina- lização, porém o fizeram em meio à uma política estatal. Nenhum
partiu da descriminali- zação. Ela pode ser a chegada, não pode ser a partida.
Ao ser ponto de partida, ela soa como liberalizante", defendeu, lembrando
que o Brasil vive um cenário de dificuldades com o crack.
A
sessão também foi marcada por outras 11 sustentações orais, sendo seis delas em
defesa da descriminalização e as outras cinco, contrárias. O julgamento será
retomado hoje, com o voto do relator, Gilmar Mendes. Os ministros analisam a
constitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343, de 2006.
O texto
define como crime adquirir, guardar ou portar drogas para consumo pessoal. O
que está sob análise é um recurso que chegou ao STF em 2011 e tem repercussão
geral, ou seja, servirá como base para decisões em todos os tribunais do País.
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